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Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=WxJHhc_6vPs&feature=youtu.be
Publicado por Folha Políticahá 5 anos
A foto de uma jovem em uma praia, da no Facebook, motivou o comentário de uma amiga. "Ficou morena?", perguntou. A menina da foto, para não deixar dúvida sobre como se enxerga, respondeu com um palavrão irreproduzível: "Sou loira, p..." Desde setembro, a jovem da foto, Vanessa Daudt, frequenta o curso de enfermagem na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, a Uerj. Para a instituição, no entanto, ela apresentou uma ideia diferente sobre seu tom de pelé e sua descendência. Vanessa declarou ser negra ou índia e afirmou ter baixa renda. Conseguiu, assim, ingressar na faculdade apesar de ter ocupado o 122º lugar na classificação geral, para um curso com 80 vagas.
O caminho da investigação será longo. Os promotores tentarão, no âmbito criminal, encontrar uma saída para um problema criado por uma política equivocada, que classifica pessoas segundo critérios raciais. Pesquisa do geneticista Sérgio Danilo Pena, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), identificou que 60% dos brasileiros que se julgam "brancos" têm sangue africano ou indígena nas veias. O caso do sambista Luiz Antônio Feliciano Marcondes, o Neguinho da Beija-Flor, é simbólico. Exame feito pelo laboratório de Pena identificou que ele tem 67,1% dos genes de origem na Europa e apenas 31,5% da África.
Na sexta-feira, no intervalo de uma das aulas do curso de enfermagem da Uerj, Vanessa, a estudante loira que abre este texto, defendeu seu direito ao benefício. Vanessa disse que sua documentação foi aceita, e que é "carente". Como não existe cota para quem é branco e carente, declarou-se "negra ou índia". "Digo que sou da cor que eu quiser", afirmou. Ela acertou em cheio a origem do problema do sistema das políticas raciais.
Vale, para os efeitos legais, a autodeclaração da cor da pelé. De acordo com a legislação brasileira, não é função do Estado determinar a raça de uma pessoa. Ou seja: é negro ou índio quem decidir assim se classificar perante a instituição. Quando a universidade tenta interferir, a confusão é imensa, como provou o caso dos gêmeos univitelinos Alex e Alan Teixeira da Cunha - o primeiro classificado como branco e, o segundo, como negro pela Universidade de Brasília (UnB). O disparate no enquadramento de pessoas geneticamente idênticas levou a UnB a modificar o ingresso dos cotistas. Em vez da simples declaração do estudante, há uma entrevista pessoal com o candidato - algo que, obviamente, não corrige uma política torta, mas afugenta quem tenta se aproveitar de brechas legais.
Para o sociólogo Demétrio Magnoli, do Grupo de Análises de Conjuntura Internacional (Gacint) da USP, são claros os sinais de que os critérios raciais são um erro, e não atendem o objetivo de promover igualdade. "Polícias raciais dividem o país em grupos e produzem atritos, o que é perigosíssimo em qualquer sociedade. É preciso abolir o princípio da autodeclaração, para o bem do funcionamento do sistema", alerta.
O sociólogo Simon Schwartzman, um dos autores do livro Divisões Perigosas: Políticas Raciais no Brasil Contemporâneo (Editora Record/Civilização Brasileira), avalia que os critérios de cotas dificilmente serão ajustados simplesmente por um aperto no controle. O mais adequado, afirma, seria que as instituições de ensino originassem soluções para privilegiar alunos carentes, em vez de tentar uma segregação. "O sistema inteiro de cotas tem problemas. Todos os critérios são muito grosseiros. A solução não é apertar o controle, mas uma política mais inteligente de preferências, que amplie o sistema de apoio para quem realmente precisa", afirma Schwartzman.
A lei estadual fluminense que instituiu o sistema de cotas exige que pelo menos duas condições estejam atendidas. Baixa renda é o critério indispensável. A segunda condição pode ser raça (declarar-se indígena ou negro), ser filho de policiais mortos em serviço ou inválidos ou, ainda, tratar-se de pessoa com deficiência física. O problema é que o critério de renda é facilmente burlável. O candidato cotista deve comprovar renda familiar per capita bruta de até 960 reais.
Curso mais disputado da Uerj, com 135 candidatos por vaga (para não cotistas) em 2013, a graduação em medicina concentra o maior número de denúncias sobre irregularidades. A primeira denúncia do inquérito civil instaurado pelo Ministério Público é referente à fraude no concurso de 2004 para a graduação - um curso no qual cada estudante custa aos cofres públicos 54.300 reais por ano. Na lista com nove suspeitos de fraudes havia moradores de áreas nobres do Rio, como o bairro da Lagoa.
Em janeiro do ano passado, o MP recebeu outra denúncia anônima com 41 nomes de aprovados em 2013 que teriam fraudade os critérios estipulados pela lei 5.346. A denúncia foi entregue em um CD com notas e imagens dos universitários que não aparentam pertencer à raça declarada na inscrição do vestibular. Quatro dos universitários citados são estudantes de medicina: de pelé clara, com cabelo liso, João Pedro Galiza Xavier é um dos apontados no material. Classificado na 542ª posição entre os vestibulandos de medicina, não teria garantido uma das 94 vagas da graduação se não tivesse disputado como cotista negro ou índio. Na internet, Galiza, que estudou no GPI (curso pré-vestibular particular no Rio de Janeiro) agradece aos professores do curso pela aprovação. "Sou eternamente grato a alguns professores. Todos são responsáveis pela minha conquista. Continuem sendo professores maravilhosos, que tornam sonhos que parecem impossíveis em realidade". O curso GPI, frequentado por Galiza, tem mensalidade integral de 1.082,40 reais.
Na hora de comprovar a renda familiar, pode-se simplesmente omitir o rendimento de um ou mais integrantes da família. A lei 5.346 prevê um mecanismo para garantir que haja, pelo menos, algum controle sobre o que declara o candidato. O parágrafo 3º do artigo 1º estabelece que as universidades devem "criar mecanismos de combate à fraude". De fato, existe na instituição uma Comissão de Análise Socioeconômica, formada por três servidoras públicas e 28 assistentes sociais. Após a análise da documentação, a comissão realiza, segundo a universidade, "visitas domiciliares a alguns candidatos para dirimir dúvidas". Em 2010, foram 14 dessas visitas, segundo documento da Uerj enviado ao MP. Em 2011, foram três. Segundo declaração de Lena Medeiro de Menezes, sub-reitora de graduação, não são feitas visitas fora do Estado do Rio. Ou seja, morar fora do território fluminense é garantia de que não haverá confirmação dos dados apresentados.
Investigação - Os casos investigados agora pelo MP envolvem 15 cursos de graduação. Estudante de direito, Thatyane Alecrim Azeredo tem cabelo liso e olhos claros - no Facebook, amigos discutem se são azuis ou verdes. Classificada na 871º colocação geral do curso de direito, Thatyane estaria longe das 312 vagas disponíveis para o curso em 2013. Mas, como declarou-se negra ou indígena, em vez de disputar uma vaga com outros 28,95 vestibulandos não cotistas, concorreu com 3,67 candidatos por vaga. Na página de relacionamentos, Thatyane u, no dia 19 de setembro, uma foto com a turma no hall da Uerj. "Felicidade após trote", escreveu. Outra aluna aprovada no vestibular de 2013 como cotista é Dianne Leite da Silva. Branca, com cabelos e olhos claros, ela foi classificada na 266ª posição geral para o curso de jornalismo - longe das 50 vagas oferecidas pelo curso.
Pela disputa afunilada, conquistar uma vaga em uma universidade pública é motivo de orgulho - para os estudantes e para os pais. Ao comemorar a aprovação na Uerj, muitos dos investigados ram no Facebook o espelho da classificação, mas com um cuidado: cortaram o trecho que explicita a inscrição como cotista. "Mais um sonho realizado e sem vocês isso não seria possível", escreveu Vitor Pablo de Souza Gilard, aprovado no vestibular para jornalismo no ano passado. O jovem branco de cabelos escuros omitiu aos amigos da rede social que para ingressar na Uerj se declarou negro ou índio. Procurado pelo site de VEJA, Gilard se recusou a explicar a razão de ter se inscrito como cotista.
Indignação dos estudantes - Como mostra a ciência, não é possível classificar a descendência com base na cor da pelé. Mas são estes - e os sinais inequívocos de condição social - os critérios que embasam denúncias dos próprios estudantes. A presença de cotistas brancos, com olhos claros, com celulares caros e aparelhos como iPads, tem revoltado universitários que precisaram estudar anos para conseguir uma vaga na Uerj. Alguns chegam a acusar a Uerj de acobertar as fraudes. O baixo número de sindicâncias instauradas é outro motivo de reclamações: foram apenas 17, até agora. "A Uerj está preenchendo vagas com pessoas que se dizem negras ou pobres sem comprovação válida. Apenas com uma declaração", disse um dos denunciantes, em 2011.
Apesar do elevado número de denúncias, até o momento apenas um estudante foi expulso por ter burlado a reserva de vagas: Bruno Barros Marques, de 29 anos, teve a matrícula cancelada no ano passado. De acordo com investigações da Uerj e do MP, para concorrer a uma vaga de cotista em 2009, Marques se passou por estudante carente e declarou renda de 450 reais, omitindo os comprovantes de rendimento do pai, aposentado da Petrobras e proprietário de uma loja de material hidráulico e elétrico na Tijuca, na Zona Norte do Rio. Além disso, declarou ser negro. Outra investigada pela universidade é Lívia Leba, filha do delegado da Polícia Civil Carlos Augusto Neto Leba, aprovada como cotista na faculdade de medicina. O caso de Lívia corre em segredo de Justiça.
Desde a última segunda-feira, a reportagem do site de VEJA tenta ouvir o reitor da Uerj, Ricardo Vieiralves de Castro, ou um porta-voz da universidade sobre o inquérito civil 118/11, que apura se a Uerj tem um sistema eficiente para prevenir e investigar fraudes no sistema de cotas, como determina a lei, e se há improbidade de servidores públicos responsáveis pela avaliação de documentos e sindicâncias. A Uerj não apresentou nenhum porta-voz. A universidade argumenta, em um documento incluído no inquérito cicil 118/11, que a lei 5.346 estabelece que, para concorrer à vaga de cotista, o candidato pode se autodeclarar negro ou índio e que, portanto, não cabe à instituição investigar ou duvidar de tal declaração. "A Uerj não promove qualquer 'tribunal de cor', portanto, seu principal critério é a autodeclaração", escreveu Vieiralves, em agosto de 2008, em resposta a um pedido do Ministério Público, ignorando que a lei 5.346 determina que as universidades criem mecanismos de combate às fraudes.
Em maio de 2013, depois de diversas cobranças do MP relacionadas à falta de fiscalização em relação às declarações dos alunos, Valdino de Azevedo, assessor do reitor, argumentou que a "autodeclaração cria enorme dificuldade para esta entidade de ensino superior". Azevedo chega a dizer que "o sentido de pertencimento foge aos critérios objetivos de julgamento".
No Supremo Tribunal Federal (STF), em ação apoiada pelo partido Democratas (DEM), foi questionada a legalidade da política de cotas raciais no processo seletivo da Universidade Nacional de Brasília (UnB). A legalidade foi reconhecida por unanimidade pelos 12 ministros do STF. Autora da ação, a jurista Roberta Fragoso avalia que eventuais acusações de fraude na declaração de raça dificilmente serão reconhecidas na Justiça como crime. Justamente porque não existem no país - felizmente - leis para dividir a identidade da população pela cor da pelé. Procuradora do Distrito Federal e autora do livro Ações afirmativas à brasileira: necessidade ou mito? (Editora Livraria do Advogado), Roberta avalia que essa divisão legal seria um retrocesso. "Se o Ministério Público acusar alguém de não ser negro, teria de fazer um exame de DNA de ancestralidade. Não há no Brasil como definir quem é o pardo ou o mestiço. É possível que pessoas de aparência branca tenham descendência africana. Cota racial é uma falácia. Sempre dará ensejo a fraudes", diz a jurista.
Pâmela Oliveira e Daniel Haidar
Veja
JOJunia OliveiraLarissa Riccipostado em 18/05/2018 06:00 / atualizado em 18/05/2018 07:35
Cerco a estudantes acusados de burlar o sistema de cotas para conseguir vaga na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Sessenta e dois alunos estão na berlinda, correndo risco de expulsão. Desses, 34 já serão submetidos a processo administrativo disciplinar, resultado de sindicância instaurada no ano passado pela instituição para apurar supostas irregularidades. Os nomes de outros 28 foram apresentados ontem em dossiê elaborado por alunos integrantes do movimento negro, em mais uma série de denúncias. Uma comissão formada para conduzir e acompanhar as ações afirmativas promete fazer uma devassa em documentos e até na vida de candidatos ao sistema e seu núcleo familiar, em caso de suspeita de fraude, mas a Federal afirma que não vai promover uma “caça às bruxas”, apenas aprimorar a política social.
O escândalo das cotas na maior universidade pública do estado ganhou força em setembro de 2017, quando um grupo de alunos denunciou três outros que teriam burlado o sistema para ingressar no curso de medicina, entre eles, um jovem loiro dos olhos azuis. Em novembro houve nova denúncia, naquela oportunidade envolvendo uma aluna do mestrado. A UFMG abriu sindicância e, quase oito meses depois das primeiras acusações, divulgou o resultado da primeira fase das investigações. A universidade informou que o processo administrativo e disciplinar corre em sigilo, para preservar a dignidade dos envolvidos, e assegura, de acordo com os ordenamentos jurídicos do Ministério da Educação (MEC) e da própria Federal, ampla defesa aos investigados.
Ao todo, a comissão de sindicância analisou 61 denúncias de supostas fraudes de estudantes que entraram na instituição pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu) em 2017. Dessas, 34 resultarão em processos e 10 se referem a estudantes que já se desligaram da instituição. Em 17 casos a comissão validou a autodeclaração (pretos/pardos e indígenas) por meio da análise fenotípica – cor da pele, tipo de cabelos, formato dos lábios, entre outras características. “O processo administrativo e disciplinar é a segunda etapa, a continuidade da sindicância investigatória. Foram juntados documentos e, a partir daí, houve a abertura de processo em relação aos 34. Esses estudantes serão novamente chamados. Haverá novamente coleta de informações”, afirma o pró-reitor de Assuntos Estudantis, Rodrigo Ednilson de Jesus. Segundo ele, com base no trabalho da primeira comissão, o novo grupo formado para verificação das informações vai emitir parecer, indicando a aplicação ou não das punições – a máxima é o desligamento da universidade. “Essa comissão de procedimento vai definir a penalidade adequada depois de identificar e apurar os fatos”, ressalta.
A Comissão Permanente de Ações Afirmativas e Inclusão Social da UFMG foi criada para elaborar, acompanhar e conduzir a política de ações afirmativas e de inclusão social da universidade. Ela terá nove pessoas, entre negros e brancos, representados por docentes, funcionários técnico-administrativos e estudantes ligados ao tema. De acordo com a instituição, seus integrantes poderão “fazer entrevistas, visitas em domicílio, consultas a cadastros de informações socioeconômicas do candidato e do seu núcleo familiar e aplicação de questionários com múltiplas questões sobre a raça para a verificação do pertencimento racial”. O grupo será instituído por meio de portaria. A previsão é de que o documento seja assinado nos próximos dias pela reitora Sandra Goulart Almeida.
Questionado sobre a autodeclaração prevista na Lei das Cotas para o candidato a vaga em instituição federal de ensino, Rodrigo Ednilson diz que a autodeclaração precisa se respaldar em critérios. “Do ponto de vita jurídico, fazemos referência a dois pareceres do Supremo Tribunal Federal, dos ministros Ricardo Levandowski e (Luís Roberto) Barroso, reconhecendo que a autodeclaração não se dá no vazio nem de forma autônoma, porque é uma negociação entre como o sujeito se vê e como ele é visto”, afirma. “Embora reconheçamos a validade da autodeclaração, em termos de denúncia a universidade precisa investigar e tem instrumentos para tal. A classificação para isso é um princípio juridicamente reconhecido, tanto quanto a autodeclaração”, completa.
MESTIÇOS O pró-reitor defende ainda que um ponto é o reconhecimento do sujeito mestiço. “O filho de negro e branco, mas que não se reconhece como estudante negro. A política de reserva de vaga racial é para estudante negro, preto ou pardo, ou seja, negro de pele clara (pardo) e negro de pele escura (preto). Mas não é possível ser pardo sem ser negro, e talvez essa confusão é que esteja no imaginário da população brasileira: a do mestiço sem raça”, ressalta. “E a política não é dirigida para pessoas sem raça, mas para esse negro, seja ele de pele clara ou escura.”
Além das medidas, a Federal de Minas informa que vai investir em educação racial e na divulgação de materiais para orientar os candidatos a não agir de má-fé. “A decisão não vai na direção de uma ‘caça às bruxas’, mas de aprimoramento social, de construir um procedimento mais adequado.”
Os alvos mais recentes de denúncias de fraude nas cotas raciais da UFMG são alunos que foram aprovados no Sistema de Seleção Unificada (Sisu) de 2018 e entraram na graduação este semestre ou entrarão no próximo. “São casos gritantes e escandalosos de uso indevido de cota racial. Nós tivemos a preocupação de nem contar o estudante pardo. Procuramos casos de absoluta negligência da política pública”, disse Alexandre Braga, presidente da União de Negros e Negras pela Igualdade (Unegro). A UFMG anunciou que esses 28 casos também passarão pelo crivo da comissão de sindicância. Se constatadas irregularidades, os alunos sofrerão processo administrativo disciplinar.
Sob o lema de “Fraudes nas cotas não passarão em branco”, uma página no Facebook foi criada para reunir as denúncias. Cerca de 40 pessoas participaram da comissão de triagem para encontrar alunos acusados nos cursos de odontologia, ciências sociais, medicina, comunicação e psicologia. Em formulário de preenchimento obrigatório, o denunciante devia pôr nome e curso dos alunos que julgava ter fraudado o sistema. Segundo ele, o grupo recebeu 154 denúncias. “Fizemos uma triagem e, destes, foram gerados os 28 protocolos de suspeitas de fraude, que foram levados à UFMG”, pontuou Alexandre. Ele explicou que os critérios principais são cor da pele e traços físicos. “Procuramos o perfil dos alunos nas redes sociais (como Facebook e Instagram) e fizemos esse relatório, incluindo também o número de matrícula.”
Os nomes dos acusados de fraude não foram divulgados. “Informamos os nomes só para a universidade, mas isso ficará aberto para consulta públicas nas redes sociais. O objetivo não é criar nenhum conflito com o estudante, mas garantir a integridade da política pública. Os investigados não foram contatados, para que pudéssemos oficializar a denúncia”, disse.
Alexandre Braga contou que a plataforma continua aberta a novas denúncias. “Provavelmente haverá mais casos. Continuaremos apurando e enviando para a UFMG. E, agora, fica um alerta para o estudante que quer entrar na universidade pública. Nós não queremos punir ninguém. Queremos orientar que existe uma política pública que precisa ser respeitada e não é pra todo mundo. Se fosse para todo mundo, não precisaria da política”, afirmou.
O que diz a lei
A Lei 12.711, de 2012, conhecida como Lei de Cotas, determina que universidades e institutos federais reservem metade das vagas de graduação para quem cursou integralmente o ensino médio em escolas públicas. Nesse universo, são estabelecidos critérios de renda e raciais. Metade das vagas será destinada a alunos da rede pública de famílias com renda de até 1,5 salário mínimo por pessoa. Os outros concorrentes da rede pública poderão ter qualquer renda. A porcentagem de alunos que se autodeclaram pretos, pardos, indígenas e deficientes terá de ser no mínimo a mesma dessa população no estado, segundo censo do IBGE.
Sindicância
61
denúncias contra estudantes que entraram na UFMG supostamente burlando a política de cotas raciais foram analisadas
34
apurações resultarão em processos, que podem culminar até em expulsão
10
se referem a estudantes que já se desligaram da instituição.
17
estudantes que se beneficiaram da política tiveram a autodeclaração de pretos/pardos e indígenas validada por meio da análise de cor da pele, tipo de cabelos, formato dos lábios, entre outras características.
Luiz Fernando Toledo, O Estado de S.Paulo
12 de janeiro de 2018 | 03h00
Atualizado 12 de janeiro de 2018 | 14h24
SÃO PAULO - Uma em cada três universidades federais do País já investigou a matrícula de estudantes por suspeita de terem fraudado o sistema de cotas raciais. É o que mostra um levantamento do Estado nos processos administrativos instaurados pelas instituições, todos obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. A maior parte das denúncias vem de movimentos negros. Para reduzir as fraudes, o governo federal quer formatar uma comissão para orientar análise visual dos alunos.
Queixas. Os acusados alegam que tiveram poucas informações sobre o indeferimento; alguns conseguiram se manter nos cursos com liminar judicial Foto: Marcos Nagelstein/Estadão
Das 63 federais no País, 53 responderam aos questionamentos. No total, há 595 estudantes investigados em 21 instituições de ensino. A maioria já teve a matrícula indeferida, mas parte conseguiu retornar aos estudos por liminares, contrariando as decisões administrativas.
Os acusados alegam que tiveram poucas informações sobre o indeferimento. “Eu me senti um lixo, sendo analisada pela aparência, como um objeto. Achei que haveria pelo menos uma entrevista. Acredito que tem fraudadores mesmo, mas no edital que participei era autodeclaração. Eu não fraudei nada”, diz uma aluna da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que buscou advogada para manter a vaga.
Mas nos documentos analisados foram encontrados estudantes que se autodeclararam quilombolas mesmo sem nunca ter vivido em uma comunidade e alunos acusados por movimentos negros de serem brancos. O caso mais comum, no centro da polêmica, é o dos pardos, que muitas vezes são identificados - e denunciados - como “socialmente vistos como brancos” e, portanto, não deveriam utilizar o sistema, segundo os movimentos sociais.
Pelo mapeamento, cursos mais concorridos são o principal alvo de denúncias. Os mais recorrentes são Medicina e Direito, com casos em praticamente todas as instituições que têm ou já tiveram alguma sindicância. Com o surgimento cada vez mais frequente de denúncias, feitas principalmente por movimentos negros e pelos próprios colegas, parte das instituições começou a criar comissões de aferição da autodeclaração de raça feita pelos alunos. Mas a falta de padrão criou distorções.
Por isso, o governo do presidente Michel Temer decidiu reativar um grupo de trabalho, encabeçado pelo Ministério de Direitos Humanos e incluindo secretarias do Ministério da Educação e da Fundação Nacional do Índio (Funai), que deve finalizar um documento para dar base a comissões de aferição de autodeclaração da etnia dos estudantes em todas as universidades federais do País. Hoje, só parte das instituições faz esse procedimento.
O Estado apurou que o modelo que está sendo desenhado pelo governo federal prevê bancas com cinco pessoas, formadas de maneira diversificada tanto em gênero quanto em etnia dos avaliadores. Só novos alunos seriam avaliados, antes da matrícula, e o único critério seria a aparência do candidato. “O fenótipo (aparência) deve ser o primeiro aspecto a ser considerado. A questão do racismo no Brasil é de marca, e não de origem. As pessoas são reconhecidas socialmente enquanto negras pelos traços fenotípicos”, avalia Juvenal Araújo, secretário nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, órgão vinculado ao Ministério de Direitos Humanos (MDH).
A Universidade de Brasília (UnB) foi pioneira no método de aferição. Também primeira federal a utilizar cotas, em 2004, na instituição o candidato era fotografado e seu pedido de inscrição, com a foto, era analisado por uma comissão - que fazia a homologação. Este método deixou de existir a partir de 2013, quando entrou em vigor a lei federal que pedia somente a autodeclaração do estudante.
Entre os especialistas, não há consenso sobre as comissões. “Pode criar uma espécie de tribunal racial, no qual a população negra estaria, mais uma vez, alijada das decisões sobre a própria identidade e pertença. Quem comporia essas comissões? Quais seriam os critérios para a escolha dos homens e mulheres que decidiriam quem é ou não negro no Brasil?”, indaga a professora Inaê Santos, da Fundação Getulio Vargas-Rio e do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC-FGV).
Já o especialista em ações afirmativas Frei David Santos diz que é essencial combater fraudes. “Essas práticas criminosas precisam ser atacadas exemplarmente, para garantir que os reais destinatários da medida sejam contemplados.”
A Lei 12.711/2012, sancionada em agosto de 2012, garante 50% das matrículas por curso e turno em todas as universidades federais e institutos federais de educação, ciência e tecnologia a alunos que estudaram integralmente no ensino médio público, seja em cursos regulares ou Educação de Jovens e Adultos (EJA). O restante das vagas fica para ampla concorrência.
As vagas reservadas são subdivididas. Metade fica para alunos de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 salário mínimo per capita e a outra metade para alunos de escola pública com renda familiar superior a 1 salário mínimo.
Há ainda uma porcentagem mínima correspondente à soma de pretos, pardos e indígenas (PPI) no Estado, que considera o último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No Rio Grande do Sul, por exemplo, que registrou 15,6% de sua população como PPI, deve-se registrar essa quantidade nas cotas em todas as universidades federais para esta população.
Mais de três meses depois, coletivos negros ainda aguardam desdobramentos de denúncia; DPU também abriu procedimento para investigar o casoSCHIRLEI ALVES, FLORIANÓPOLIS24/09/2018 ÀS 06H00
Três jovens negras ouvidas pela reportagem que estudam no curso de direito da UFSC relatam episódios de racismo dentro da instituição e apontam que as cotas para negros não se refletem nos corredores. Os coletivos negros do departamento defendem um pente fino com todos os alunos cotistas, inclusive, eles próprios. O ND teve acesso a uma lista com 114 nomes de alunos que entraram na universidade por cotas raciais. A relação é a mesma encaminhada ao MPF (Ministério Público Federal). Em busca nas redes sociais, foi possível identificar ao menos 14 alunos brancos. A suspeita é de pelo menos 40.
Quando prestou vestibular para o curso de direito na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e conseguiu a vaga por meio do sistema de cotas para negros, Tereza* estava prestes a realizar um sonho. Idealizava um ambiente de inclusão, da diversidade e dos movimentos sociais. Só que a ilusão esfacelou-se logo no início das aulas. O primeiro susto foi no alojamento dos estudantes, onde ficaria por dois meses. Segundo a jovem, o lugar era quase assombrado, frio e sujo.
Detalhes de parte do corpo de três alunos de direito ouvidos pelo ND, que entraram na UFSC pelo sistema de cotas raciais, com autodeclarações de serem negros ou pardos – Facebook/Reprodução/ND
A segunda decepção veio ao entrar na sala de aula. Não encontrou outros alunos negros como previa. Ao responder às perguntas dos professores sobre suas vivências, não compartilhava das mesmas experiências da maioria dos colegas, que eram repletas de viagens ao exterior. “Percebia olhares de reprovação e tinha medo de falar. Naquele momento, eu achava que aqui não era meu lugar”, contou.
A decepção não parou por aí. Em aulas dos primeiros semestres, cujos conteúdos fazem referências históricas, a cultura negra teria sido apenas pincelada. Na fala de um dos docentes, revela Dandara*, outra aluna negra do Centro de Ciências Jurídicas, os imigrantes europeus “teriam sofrido mais do que os negros”. “Eles (os imigrantes) não foram para o tronco e não foram violentados das formas mais perversas. Além disso, a nossa cultura não se resume apenas à escravidão, as pessoas comem e dormem na nossa cultura e a gente não tem o direito de se reconhecer nela”, diz.
Quando mudou-se para Florianópolis, Aqualtune* tinha consciência do sacrifício feito pela família para que ela pudesse manter-se longe de casa e cursar o ensino superior. Mas além do preconceito enfrentado na sala de aula, ela não imaginava que a cor seria um fator determinante, inclusive, na incessante busca por estágio em escritórios e órgãos públicos. Aqualtune é a primeira integrante da família a entrar na universidade e, apesar da resistência, não pretende desistir.
“A minha mãe trata de uma doença, meu pai trabalha e paga pensão e eu recebo bolsa estudantil (R$ 670) para me manter. A situação financeira é apertada. Mas, para a minha família eu já sou a doutora”, diz Aqualtune com um sorriso.
Poucos negros em sala de aula gerou suspeita
Depois de alguns meses deparando-se com o preconceito travestido de brincadeira, os jovens negros do curso de direito afirmam que notaram que a representatividade não correspondia ao número de vagas disponíveis no sistema de cotas raciais. “Na minha sala deveria haver seis negros, onde estão os outros?”, indagou Dandara.
Após a suspeita, os coletivos negros solicitaram por meio do Portal da Transparência a lista dos alunos que foram classificados no período em que a universidade considerou apenas a autodeclaração como comprovante (entre 2014 e 2017). É que entre 2008 e 2013, os estudantes cotistas passavam por banca avaliadora.
O procedimento, segundo o professor Marcelo Henrique Romano Tragtenberg, diretor administrativo da Saad (Secretaria de Ações Afirmativas e Diversidades), foi abolido depois que uma jovem negra apoiada por outros três estudantes declarou em evento público que a banca era humilhante. O procedimento foi retomado no vestibular 2018 após suspeitas de fraude. “Um procedimento interno apurando denúncias mostrou a necessidade de retomar a verificação. Mas tem muitos negros contra as cotas, a gestão da universidade na época (em que a banca foi cancelada), inclusive, era contra a verificação”, disse o diretor.
Os coletivos que solicitaram a lista dos classificados suspeitam que cerca de 40 alunos tenham enganado o sistema por meio da autodeclaração. Os grupos chegaram a protocolar denúncia no gabinete da reitoria com apontamento de nomes, mas, duas semanas depois, decidiram retirar a acusação com a justificativa de que seria necessário fazer alguns ajustes. Os coletivos chegaram a conclusão de que o mais justo a fazer seria pedir a verificação de todos os alunos e não apenas dos suspeitos.
Depois disso, os grupos decidiram protocolar o documento final no Ministério Público Federal, cuja reunião com o procurador regional dos Direitos do Cidadão, Cláudio Cristani, ocorreu em 26 de junho. Até o fechamento da reportagem, o ND não havia recebido retorno do MPF sobre os encaminhamentos dados ao caso porque o procurador estava em férias. A UFSC informou, por meio da reitoria, que respondeu ao ofício do MPF em 4 de junho.
Em 9 de julho, os grupos também protocolaram a denúncia no gabinete do defensor João Panitz, na Defensoria Pública da União. O defensor solicitou informação sobre as cotas à UFSC e a outras instituições federais a nível de comparação dos critérios, já que não existe regulamentação pelo MEC (Ministério da Educação).
O ND teve acesso aos nomes de 114 alunos que entraram na universidade por meio de cotas raciais entre 2015 e 2017. Desses, 82 foram aprovados pela classificação de PPI (pretos, pardos e indígenas), 26 pela cota de negros, quatro como indígenas e dois como quilombolas.
Ao pesquisar o perfil dos alunos nas redes sociais, a reportagem identificou que pelo menos 14 são nitidamente brancos com características bem definidas. A reportagem tentou contato com pelo menos cinco deles, sendo que apenas três atenderam às ligações. O trio confirmou ter se autodeclarado pardo.
A primeira jovem que atendeu a ligação justificou que “as pessoas têm o hábito de julgar apenas pela foto”. Poucos minutos após a ligação, ela excluiu as fotos do perfil no Facebook. O segundo jovem que falou com o ND desligou o telefone após ser questionado sobre as fotos nas redes sociais. O terceiro, por sua vez, confirmou que é pardo e afirmou que sofre preconceito pela cor. No entanto, solicitou que o seu nome não fosse divulgado na reportagem.
Ao longo da busca, que levou cerca de uma semana, 51 perfis não foram encontrados e 18 não puderam ser identificados. No levantamento, foi possível constatar que ao menos 18 alunos são negros, 11 são pardos e dois são indígenas. A pesquisa levou em consideração apenas os perfis dos alunos que confirmam mente serem estudantes de direito da UFSC.
A UFSC reserva 50% das vagas do total de cada curso para egressos de escolas públicas, 25% para renda menor de 1,5 salário mínimo e 16% para autodeclarados pretos, pardos e indígenas. Cada uma dessas cotas reserva ainda 22% para pessoas com deficiência.
A partir do vestibular 2018, as autodeclarações de indígenas do PPI (pretos, pardos e indígenas) são verificadas pela declaração de três lideranças indígenas reconhecidas e da Funai (Fundação Nacional do Índio). Já as autodeclarações de pretos e pardos do PPI e dos negros das vagas suplementares são verificadas por uma comissão (deficientes também passam por comissão).
Cartazes com palavras de protestos estão espalhados nos corredores do CCJ – Flávio Tin/ND
A banca, segundo o professor Tragtenberg, é por unanimidade para negar, ou seja, basta que um dos cinco avaliadores confirme a raça do candidato dentro da categoria para a qual ele se autodeclarou para que seja aprovado, avaliação essa que é contestada pelos coletivos negros.
“Deveria ser, no mínimo, por maioria de votos. E se a pessoa que aprovar for amiga do candidato, como fica?”, questionou Dandara.
O diretor do departamento, contudo, diz que não há risco de haver membros na banca que tenham algum envolvimento com os candidatos. Tragtenberg garante que a banca é multicultural e é composta por representantes negros.
“O critério foi lançado pela Petrobras nos concursos públicos pela lei 12.990 (cuja constitucionalidade foi aprovada pelo STF em 2017). Ela também prevê o conflito de interesse, que deve ser evitado. Não pode ter amigo, parente e nem nada disso”, explicou o diretor.
Justiça reconhece, mas MEC faz vista grossa
A política de cotas foi considerada constitucional em 2012 quando o STF (Supremo Tribunal Federal) validou com unanimidade de votos a reserva de vagas para garantir o acesso de negros e índios à UnB (Universidade de Brasília). Na ocasião, o DEM (Democratas) havia ajuizado ação contra a instituição sob a acusação de que o sistema seria ofensivo.
Na avaliação do ministro relator do processo, Ricardo Lewandowski, “(a medida) consiste em uma técnica de distribuição de justiça, que, em última análise, objetiva promover a inclusão social de grupos excluídos ou marginalizados, especialmente daqueles que, historicamente, foram compelidos a viver na periferia da sociedade”.
O julgamento levou em consideração que a política deve ser transitória na medida em que a desigualdade histórica for sendo reparada. Só que seis anos após a decisão do STF, o MEC ainda não desenvolveu uma política que regulamente a aplicação do sistema de cotas e deixa por conta das instituições a definição de critérios, o que tem aberto brecha para as fraudes.
A denúncia dos alunos do curso de direito não é única dentro da UFSC e nem mesmo exclusividade da instituição. A UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), por exemplo, foi um das universidades federais que inseriu a banca de validação apenas no vestibular de 2018 após denúncias de fraude das autodeclarações.
Na Udesc (Universidade Federal de Santa Catarina), a cota reservada apenas para negros também é por autodeclaração. Caso a secretaria verifique no momento da matrícula que o aluno não se enquadra nas características, é que uma denúncia é submetida à reitoria de extensão. Apenas nessa condição é que o gabinete convoca o aluno para uma banca de validação. “Denúncias de fraude são recorrentes”, afirma a coordenadora de vestibular e concurso da Udesc, Rosângela de Souza Machado.
Entenda a política de cotas raciais
O diretor administrativo da Saad (Secretaria de Ações Afirmativas e Diversidades) deixou claro que a instituição oferece cotas para alunos de baixa renda distintamente às cotas raciais. A parcela de vagas reservadas aos negros, pardos e indígenas tem por objetivo reparar a desigualdade racial.
“A gente tem um atraso histórico, quanto tempo a gente vai levar para ver mais negros entrando no doutorado, por exemplo. É um processo que precisa ser entendido”, explica Marcelo Tragtenberg
Na avaliação do presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB/SC, Marco Antônio André, mesmo correspondendo à maioria da população, os negros ainda são tratados como minoria. O especialista critica o descaso do MEC ao tratar o tema como institucional.
“O povo negro não chegou ao Brasil na condição de imigrante, mas de escravo. A abolição não aconteceu de fato, pois o negro foi marginalizado, continuou sendo explorado e sem oportunidade de ter uma vida digna. Isso se reflete nos dias atuais. Já os ancestrais dos que hoje gritam contra as cotas (imigrantes europeus), muito provavelmente receberam cotas de terras quando chegaram ao Brasil”, defende o representante da OAB.
André, assim como as alunas do curso de direito da UFSC, aponta que a negligência com o povo negro começa lá no currículo disciplinar do ensino fundamental, que deixa de aprofundar a história dos africanos, embora a lei 9.394 de 1996 determine a inclusão da cultura afro-brasileira na rede de ensino. O racismo que o advogado chama de “implícito” e é classificado como “recreativo” pela jovem Dandara, acaba refletindo dentro das instituições.
“O despreparo para tratar do assunto abre margem para a afro-conveniência: a pessoa não se reconhece como negra, mas quando aparece uma situação em que ela pode ser beneficiada por isso, ela fala que o tataravô era escravo. Para ser agraciado (com a cota), necessariamente você tem que ter pele parda ou ser negro de fato. Eu sou negro e não tem como dizer que não sou”, defendeu André.
O defensor público João Panitz que recebeu a demanda dos alunos de direito, pediu informações a outras universidades para entender como a política é aplicada, em função da complexidade e da polêmica em torno do tema.
“Eu não tenho a resposta (de como deve ser), por isso quero ver como estão fazendo, mas é mais complexo do que sentar na frente da pessoa e dizer que ela não tem direito porque não tem traços”, ponderou Panitz.
As alunas entrevistadas pela reportagem não quiseram se identificar para evitar represálias. Por isso, elas foram representadas com nomes fictícios de mulheres negras representadas na história:
*Tereza de Benguela foi uma líder quilombola do século XVIII, no Vale do Guaporé (MT)
*Dandara dos Palmares foi esposa de Zumbi dos Palmares, uma guerreira negra do período colonial do Brasil, na Serra da Barriga (território que pertence ao estado de Alagoas).
*Aqualtune era a avó de Zumbi dos Palmares, guerreira e princesa africana.
Fonte:
https://ndmais.com.br/noticias/ministerio--federal-investiga-suspeita-de-fraude-em-cotas-da-ufsc/