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'A terra é essencial para fazer as demais políticas para essas populações avançarem'. Na foto, indígenas e quilombolas protestam em Brasília, em 2015
A ascensão de Michel Temer ao Planalto em 2016 trouxe uma onda de confiança aos setores conservadores do Congresso. Sem Dilma Rousseff, haveria menos resistência no governo para pautas restritivas de direito. O clima é tão favorável que diversos políticos perderam qualquer pudor em suas declarações. Em poucos meses, os direitos de quilombolas e indígenas foram alvejados discursivamente por diversas figuras políticas que gravitam em torno de Michel Temer.
Moradora da Ilha de Marambaia, remanescente quilombola, mostra o que cultiva em sua roça
“Eles ficaram para trás”, diz Penteado. Nesse sentido, pontua, "informações" como a divulgada pelo deputado Jair Bolsonaro, de que o Estado gastaria 1 bilhão de reais por ano com as comunidades quilombolas, ajudam a dificultar ainda mais a situação. “Ele veicula essas 'informações' como se essas populações recebessem do Estado brasileiro tudo o que elas precisam. Quando, na verdade, é o contrário. O direito à terra é apenas tecnicamente reconhecido”, constata. Segundo Penteado, dos 1,5 mil processos de titulação parados no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), 80% deles estão na fase inicial de registro, que engloba o esforço de pesquisas, relatórios antropológicos, levantamentos cartográficos, entre outros. “Todo esse levantamento científico é caro, pois envolve viagens e estudos para embasar os relatórios. Isso exige recursos factíveis com a demanda de trabalho que precisa ser feito”, afirma. O orçamento deixa isso claro. Em 2010, segundo informações do Portal do Orçamento, do governo federal, as ações que afetam diretamente as comunidades remanescentes de quilombos receberam financiamento de R$32,6 milhões da União. O dinheiro vai para ações que promovam a cultura afro-brasileira, as comunidades tradicionais e o programa Brasil Quilombola. Outra ação prevista, a gestão da política de desenvolvimento agrário, em 2010, teve orçamento zero naquele ano. Além disso, houve um corte importante para 2017 do financiamento da política de titulação de terras. A proposta enviada ao Congresso prevê 4,1 milhões de reais para esta rubrica, ante 8 milhões de reais designados para a atividade em 2016. Além disso, a competência de delimitação das terras dos remanescentes das comunidades dos quilombos foi transferida pelo governo de Michel Temer do extinto Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário para a Casa Civil. O receio é que, com a mudança, o andamento dos processos fique ainda mais vulnerável às pressões políticas. Para Ronaldo dos Santos, coordenador-executivo da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Rurais Negras Quilombolas (Conaq), um dos maiores obstáculos para o avanço das políticas de titulação de terras é a atuação da bancada ruralista no Congresso Nacional. "São eles que não deixam que a pauta avance. E eles dominam o Congresso atualmente", diagnostica. "Um dos argumentos utilizados pelos ruralistas é que o percentual de terras dedicados aos indígenas e quilombolas inviabilizam o projeto de desenvolvimento nacional. Esse discurso nega a nossa nacionalidade, afinal, estamos falando de cidadãos brasileiros também", critica. Se nos governos anteriores faltava vontade política, no contexto atual há uma atuação contrária da esfera federal, tanto para os indígenas quanto para os quilombolas. Caso o cenário continue se agravando, a tendência é que a violência, em especial no campo, contra esses povos continue aumentando. Em 2016, 61 pessoas foram assassinadas em decorrência de conflitos no campo. Desses, 13 assassinatos vitimaram indígenas e outros quatro eram quilombolas, segundo dados da Comissão Pastoral da Terra. “São várias ações que mostram que realmente há uma política contrária a um direito básico, que é o direito à terra. É ele que tem sofrido mais ataques. Quando o ministro da Justiça fala para os indígenas que “terra não enche barriga”, isso questiona o direito básico delas, que é o direito à terra”, diz Penteado.